Era uma garota chamada de Aninha, tão tolinha, na flor da idade. Cabelos naturais em cachos ruivos, pele alva
revestidas de sardas. Aninha gostava de pensar que conhecia o mundo com as
palmas miúdas das mãos, só porque lia muitos livros e contos. Não sabia Aninha
que tão pouco ainda havia vivido, e que sua autoconfiança nada mais era do que
imaturidade. Ou melhor, ingenuidade.
Aninha logo se apaixonou por um
rapaz, entregou-se ao amor como se estivesse entrando ao mar pela primeira vez.
Braços abertos, pernas trêmulas tentando manter-se de pé diante das turbulentas
ondas. Mistura de sensações, entre medo, alegria, contemplação, angústia...
Feito liquidificador em seu peito.
Aninha logo se transformou em
Ana, o “inha” soava ingênuo demais para a mulher que estava nascendo diante do
espelho. Ana percebeu que Aninha era tolinha mesmo, que suas teorias da vida
não passavam de ilustrações baratas, feito clichês em liquidação. Pobre Aninha,
pensava Ana, olhando para o espelho, percebendo que estava mais moça, mais
alta, mais dona de si.
Ana, a meado de seus vinte anos,
considerava-se mulher suficiente para declarar em versos altos o significado da
vida. Que, para ela, era o amor. Substantivo abstrato. Em seu peito de mar, de
a-mar. Era ana e o mar. Ana e o amor. E tudo parecia fazer-lhe sentido. Era
feito uma base de concreto, mas como pode, Ana? Como o amor, sendo abstrato, se
solidificar?
Ana diante de seu erro. Ana
diante do amor sólido. Que de sólido feito pedra foi atirado contra a sua
cabeça. Pobre Ana iludida, com dor de cabeça. Sentido? Qual? O amor se desfigurou
em seu peito, mostrou-se em seus olhos que não era concreto, era líquido, era
lágrima, com gosto amargo na boca. E agora, Ana? Qual o sentido?
Ana mais uma vez se transformou,
dessa vez em Anastácia. Sim, seu nome de RG, igual ao de sua avó. Seu nome soava-lhe
ao ouvido tão ríspido, tão ameaçador. Fora deixado de lado no dia de seu
nascimento. Aquela criatura frágil, recém-nascida, não combinava com um nome
tão forte e antigo. Era o que todos concordavam.
Hoje isso já não a importa.
Aninha ou Ana, seja como queiram chamar, já não se importava com a sonoridade
das palavras. Talvez isso até a motivasse a adotar um “novo” nome. E agora ela
se nomeava como Anastácia. Ríspida. Crua. Fria. Épica. Entre outros adjetivos.
Mas, e o sentido? E a vida? A autoconfiança?
Anastácia simplesmente não
denominou mais nada. O que era interrogação, continuou sendo. O que não era,
passou a ser. A vida se assumiu como uma estranha, ela já não a subestimava
mais.
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