domingo, 23 de setembro de 2018

Um bicho me mordeu

Rebelde sem causa
Tristeza sem motivo
Como posso sentir isso?
Tá tudo bem, tudo normal
Mas as vezes um bicho me morde
E fico mal.

Do nada me sinto virada
Do avesso e amassada
Como um pano maltrapilho
E sem motivo me pergunto
Por quê diacho me sinto assim?

Olho o mundo a minha volta
Erguida pelas pontas dos pés
Tentando olhar o mais distante  
Percebo que meu umbigo
É um ponto tão minúsculo
Que desaparece na multidão.

E de tão pequena e fugaz
Que é  minha existência
Em comparação ao universo
Me desapareço em meio 
Ao meu completo caos.

Devastação

Devastação
É o que se expande
Se espalha e se dilacera
Em minha pele.  

De repete
Sinto um breu
Meus olhos taciturnos
Pairam sobre a distorção.
                                              
Estes olhos ardem
Com a acidez do ar
E a água devastada em mim
Transborda ao ar livre.

Vaza feito torneira quebrada 
De pingo em pingo
Até que de repente tudo se aquieta
E o silêncio se faz rei.

terça-feira, 21 de agosto de 2018

Anônima melancolia


Sabe quando algo desconhecido te atinge por dentro? Como um resfriado que chega sem avisar, que transpassa no ar, invisível. Pois bem, nesse instante um sopro de sentimento anônimo me atingiu em cheio, enquanto apenas andava por aí. O sopro foi inspirado e se instalou em meu peito, se alojou no espaço empoeirado que só fez espalhar mais poeira. Dimanam por meus olhos e escorrem por minha face: o sopro misturado com poeira. Reconheço a causa da tragédia, mas desconheço o motivo. No entanto, presumo que a poeira se fez por longos anos em carne viva, até quase entupir as veias coronárias. E no peito a poeira se multiplica e se aglomera, calcifica. O sangue já não é tão vermelho, tem a cor estranha, “fubenta” pelo tom cinza do pó. Mas está dentro da veia e camuflado pela pele alva. E por fora é tudo normal, quase não parece um pré-infarto.

Cá estou

No fim das contas, nunca abandonei por completo a mania de escrever. Sumo por dias, semanas, meses, mas volto. Como cá estou, jogando palavras ao vento sem pretensão de serem lidas. Talvez seja um ritual que persiste por muitos anos, afinal, deu-se início aos 12 anos de idade, ainda tentando compreender a diferença da sonoridade do T e D. Por vezes retorno a me ler, a rever meus pensamentos, as ideias sem nexo, as opiniões que desfiz, aos esdrúxulos erros de português que até hoje tenho preguiça de corrigir, e aos meus próprios desencontros. Noto todos os contornos, linhas, expressões que expus, sempre com bastante intensidade, de quem segura o lápis em folha com tamanha força que quebra a ponta. Pois nos textos remei até à extremidade da minha alma, imersa num mundo abstrato, interior, alheia aos olhares de terceiros e ao mundo concreto. Escrevo, como alguém que está prestes a cair pela janela, segurando-se no rodapé, momento efêmero em que finjo ser escritora e não mais uma pessoa de vida medíocre, cotidiana, metódica.

segunda-feira, 20 de agosto de 2018

Eu sou tu

Como eu queria desenhar aquele teu sorriso estampado no rosto barbudo, os olhos comprimidos pelas bochechas vermelhas, sorriso incontrolável e de perfeita simetria, num dia de domingo a tarde. Como eu queria guardar o sentimento que senti ao te ver, embrulhado numa caixa de recordações. Ou melhor, mantê-lo vivo e dançante no peito. Como queria poder rever aquele sorriso sempre que precisasse, que a solidão tentasse se instalar, ou que uma novidade boa chegasse, ou simplesmente para reviver a nostalgia do momento. Porque és o amor que quero viver eternamente. É em ti que meu amor se renova e se firma mais bonito. Porque todos te enxergam em mim, como uma árvore de longas   raízes. Porque tu sou eu, e eu sou tu. 

segunda-feira, 11 de junho de 2018

Amor com gosto de fruta mordida


O amor no seu viés pragmático, sem as pinceladas do romantismo do século XX. O amor como uma construção de um objeto comum entre duas pessoas, sem uma perspectiva futurística de ideais, como casamentos, casa e filhos. O amor que pensa no que é agora, mas sem pestanejar sobre o amanhã, o qual pode ser nós, ou apenas eu e tu. O amor sem delimitação de prazo, onde o “eterno” perpassa o domínio, feito areia que escorre pelos dedos da mão. O amor que foge das amarras juvenis, dos relampejos fumegantes do mundo excêntrico dos amantes. O amor que tem gosto de fruta mordida, que já se sabe do gosto e textura que o carrega, que não se engana pela beleza do desconhecido. Amor que lateja e percorre um caminho já conhecido ou presumido. O amor que sabe quando ficar e quando ir, caso assim queira simplesmente partir. O amor que não se prende em ameaças ou promessas, em meras suposições. O amor que apenas é e vive, em sua pura essência de ser.